Por Celso Machado
Ao contrário do que pode parecer, por ter realizado o único documentário sobre seu papel no desenvolvimento de Minas Gerais, nunca fiz parte do convívio de Rondon Pacheco.
A primeira vez que falei com ele, por incrível que pareça, foi no dia que gravamos a entrevista sobre a qual estruturamos “Algodão entre espelhos”. Depois disso estivemos juntos mais três vezes: numa nova gravação e nos lançamentos aqui em Uberlândia, depois em Belo Horizonte.
Mesmo poucos, esses encontros foram marcantes. Para mim, claro. E, modestamente, penso que não causei má impressão a ele.
Relembro comentário do único desafeto com quem gravamos, o ex-deputado Sylo Costa, que nos disse do temperamento reservado dele. De manter sempre certa distância, inclusive física. Que afetos e abraços eram exclusivos para seus amigos especiais.
Nessa segunda entrevista que gravamos, fui recebido com um largo sorriso e um afetuoso abraço. Fiquei orgulhoso e lisonjeado. Ganhei um belo presente.
Acredito que a empatia tenha acontecido porque da parte dele houve disponibilidade de transmitir suas vivências e pensamentos políticos e da minha, o sincero interesse em conhece-las e registrá-las.
Graças a esse trabalho pude ter contatos e produzir depoimentos com personagens importantes da vida pública nacional como os ex-ministros Jarbas Passarinho, recentemente falecido, Delfim Neto, Camilo Pena, Alysson Paulinelli e vários outros.
Colhemos material para produzir não apenas um documentário, mas uma série. E sobre diferentes enfoques. Decidimos por focar no papel de Rondon Pacheco no desenvolvimento de Minas Gerais.
Confesso que não foi fácil a tarefa de extrair 65 minutos de mais de 15 horas de gravações. Ainda bem que contei com a competência e dedicação da sempre parceira Nara Sbreebow. Lógico, conservamos com todo carinho o original de todas as entrevistas e depoimentos.
Foi fascinante descobrir aspectos que não conhecia da amplitude do papel dele na vida pública.
O da preservação do patrimônio histórico de Minas Gerais, sem dúvida, foi um deles.
Outro, que certamente pode causar polêmica, foi aquilo que marcou sua vida, a assinatura do Ato Institucional n. 5.
Sempre que seu nome aparecia na imprensa, estava associado a isso, mas não me lembro de ter lido ou visto alguma coisa sobre o papel que ele teve nesse fato.
Nessas entrevistas que fizemos, principalmente com testemunhas desse período da ditadura, o assunto apareceu. Como não estava no contexto do documentário já que a temática era o papel de Rondon no desenvolvimento de Minas, não as incluímos.
Agora, com sua morte, estamos produzindo um programa especial trazendo esses relatos e outros trechos inéditos das gravações que fizemos com Rondon Pacheco.
Recuperamos ainda um material de quando o Praia Clube o homenageou na segunda metade década de 90 e ainda o depoimento que ele deu ao Museu da Pessoa, no ano de 2001.
Muito, mas muito ainda vai ficar de fora, pois os registros que fizemos e conservamos são bastante extensos e ricos.
Nesses momentos, resta o consolo da iniciativa que tivemos e da contribuição que estaremos legando de deixar esse material para a memória e a história de Uberlândia, de Minas e do Brasil.
A trajetória de um homem público por excelência, político íntegro e de uma conduta ilibada, uma pessoa de vida pessoal sofrida.
Sempre tive a impressão de que Uberlândia era pouco agradecida pelo que o seu mais importante político fez por ela.
Espero que, com sua morte, a cidade que tem dificuldade em reconhecer em vida, aqueles que foram e são responsáveis pelo seu crescimento, possa lhe ser mais grata.
O reconhecimento ainda que tardio.
Publicada originalmente no Jornal Correio de Uberlândia, em 9 de julho de 2016